À Sombra de Dickens
Charles Spencer Chaplin nasceu no dia 16 de abril de 1889 às 20 horas,
em um subúrbio de Londres. Sua mãe, Lili Harley, era atriz de comédia.
Seu pai, também artista do music-hall, abandonou a família quando
Charles ainda era pequeno. Um grave problema de laringite acabou com a
carreira da jovem Lili Harley, obrigando Charles Chaplin a debutar
artisticamente com apenas cinco anos de idade.
O teatro, muito freqüentado por soldados, não era propriamente um local
"seletivo", mas foi onde o pequeno Chaplin pôde demonstrar pela primeira
vez o seu grande talento para a interpretação.
Os primeiros anos da vida de Chaplin se passaram em orfanatos, e foi
neles onde Chaplin encontrou todos os elementos que utilizaria mais
tarde nos roteiros dos filmes que dirigiu e interpretou. Essa primeira
etapa da sua vida não tinha o humor nem a ironia com a qual o cineasta
sensibilizou o público do mundo inteiro. Felizmente, Chaplin acabou
construindo a sua vida com a única coisa positiva que poderia ter
herdado da sua família: a paixão pelo teatro. Graças a seu pai,
comemorou o seu oitavo aniversário contratado por uma companhia de
bailarinos chamada Eight Lancashire Lads. Pouco depois, a morte de seu
pai e a internação da sua mãe em um sanatório marcariam a vida de
Chaplin profundamente. Nessa época assinou seu primeiro contrato estável
como ator, interpretando um mensageiro em uma versão de Sherlock
Holmes. Com esse trabalho, melhorou sua situação financeira. Nesse mesmo
ano conseguiu um emprego no Circo Casey, onde pôde desenvolver as suas
habilidades cômicas. Já na primeira apresentação, conseguiu arrancar
sonoras gargalhadas do público pela maneira desesperada com a qual
recolhia as moedas atiradas à arena.
O adolescente Chaplin conseguiu um lugar na companhia do acrobata Fred
Karno, apresentado por seu irmão Sidney. Karno, que fazia sucesso com
espetáculos de mímica, chegou a ter cinco companhias, apresentando-se em
todas simultaneamente. Chaplin rapidamente superou o artista Harry
Weldon, com quem dividia o número e, em 1909, teve a sua primeira
temporada em Paris.
A Cidade Mágica
Chegando em Paris, conheceu os favores das prostitutas, e a cidade onde
os irmãos Lumiére, George Méliés e Max Linder fizeram nascer a magia do
cinematógrafo. Anos mais tarde, Max Linder diria: "Chaplin teve a
gentileza de me confessar que os meus filmes o levaram a fazer os seus
próprios filmes. Chamou-me de mestre, mas fui eu que tive o prazer de
aprender com ele". Naquela época, o mundo das imagens animadas ainda
lutava para conseguir uma linguagem própria e um reconhecimento social.
Depois de outra turnê pelo norte da Inglaterra, Karno ascendeu Chaplin a
primeiro ator das representações que a companhia faria nos Estados
Unidos, em 1910. Toronto e Nova Iorque foram as primeiras paradas desta
turnê, antes de prosseguir para o oeste. A Broadway não assimilou o
humor inglês, mas Chaplin chamou a atenção de alguns jornais e de um
jovem espectador, que nessa época trabalhava para o cinema; era Mack
Sennett, que voltaria a encontrar Chaplin dois anos mais tarde, em uma
nova turnê pelos Estados Unidos.
O Nascimento do "Tramp"
Enquanto estava na Filadélfia, em 1913, Chaplin recebeu um telegrama
pedindo-lhe que fosse até um escritório no centro da Broadway. Ali
funcionava a sede da Keystone Comedy Film Company, onde lhe ofereceram
um salário de 150 dólares para que fizesse três filmes por semana.
Depois de algumas negociações, Chaplin acabou aceitando o trabalho e, ao
chegar em Los Angeles, reencontrou Mack Sennett, que seria seu novo
chefe.
Chaplin dividiu camarim com estrelas da casa, como Ford Sterling, Roscoe
Arbuckle e Mabel Normand. No início, Chaplin teve que se adaptar ao
estilo de Sennett, com perseguições policiais e exibições de insinuantes
banhistas.
O seu primeiro filme, estreado em fevereiro de 1914, mostrava as
aventuras de um personagem cômico na redação de um jornal. Em seu
segundo filme, Corrida de automóveis para meninos (1914), criou um
personagem que logo seria identificado pelo público. Sennett pediu-lhe
que se vestisse de maneira engraçada. "Pensei que poderia usar umas
calças muito grandes e uns sapatos enormes, além de uma bengala e um
chapéu coco. Queria que tudo fosse contraditório: as calças folgadas, o
paletó apertado, o chapéu pequeno e os sapatos enormes. Não sabia se
deveria parecer velho ou jovem, mas quando me lembrei que Sennett tinha
pensado que eu era bem mais velho, coloquei um bigodinho que me daria
alguns anos sem esconder a minha expressão". Assim nasceu o famoso
"Tramp" (que os povos dos países de idioma espanhol passaram a chamar de
"Carlitos"). As disputas com outros diretores e a ambição dificultaram
sua relação com a Keystone, depois de ter filmado 35 longas-metragens em
apenas um ano. Não foi difícil conseguir, em 1915, um contrato com a
Essanay, a produtora que tinha por estrela principal Gilbert M.
Anderson, o famoso Bronco Billy dos primeiros filmes western. A partir
desse contrato, Chaplin começou a ganhar 1.250 dólares por semana e uma
bonificação extra de 10.000 dólares, com a qual formou uma equipe
bastante competente, consolidando uma técnica e um estilo próprios.
Insatisfeito com os estúdios da Essanay em Chicago e em São Francisco,
instalou-se em Los Angeles. Desde o primeiro dos quinze filmes que
realizou para essa produtora, teve a colaboração de Rollie Totheroth,
seu fiel câmera durante sua carreira nos Estados Unidos. Contratou Edna
Purviance como primeira atriz dos filmes que realizaria nos próximos
quinze anos , logo após ter começado a dirigir, percebeu "que o
posicionamento da câmera não era apenas uma questão psicológica, mas
também constituía a articulação da cena; na verdade, era a base do
estilo cinematográfico". O sucesso de Chaplin foi consolidado pelo
contrato com a Mutual em 1916. Em troca de 10.000 dólares semanais e de
uma bonificação inicial de 150.000 dólares, Chaplin comprometeu-se a
entregar doze curtas-metragens de duas bobinas, dentre os quais estão
algumas das sus primeiras obras-primas: "No Armazém" (1916), "Rua da
paz" (1917), "O balneário" (1917), "O emigrante" (1917). A produtora
colocou um novo estúdio à sua disposição, o Lone Star, e o cineasta pôde
trabalhar com liberdade, rodeado por uma equipe de fiéis colaboradores
como os atores Eric Campbell, Henry Bergman, Albert Austin e Edna
Purviance.
A respeito de seu envolvimento com Edna Purviance, o próprio Chaplin
reconheceu na sua autobiografia: "Como Balzac, que achava que uma noite
dedicada ao sexo significava a perda de uma página de algum dos seus
romances, eu também achava que seria perder um ótimo dia de trabalho nos
estúdios"
Armas em punho
Quando os Estados Unidos decidiram entrar na Primeira Guerra Mundial, em
1917, Chaplin utilizou a sua popularidade para vender bônus de guerra
com Mary Pickford e Douglas Fairbanks. Dessa experiência surgiram dois
filmes: The Bond e Nas Trincheiras (1918), uma paródia do exército.
Apesar do compromisso com a Cia. First National, o cineasta se uniu a
Fairbanks, Pickford e ao realizador David Grifith para criarem juntos a
companhia United Artists. A primeira intenção era romper o monopólio de
Hollywood, mas Chaplin só pôde começar a dedicar-se à United Artists
depois de rodar nove filmes que havia prometido à First National. Entre
eles, rodou Vida de Cachorro (1918), Os Clássicos Vadios (1921), O
Peregrino (1923) e O Garoto (1921). Essa obra-prima de seis rolos contou
com a participação do pequeno Jackie Coogan e teve que ser montada
longe do domínio dos diretores do estúdio. Nessa mesma época, Chaplin,
que já era um cineasta, casou-se com a atriz Mildred Harris, em outubro
de 1918, quando ela tinha apenas dezessete anos, tiveram um filho que
morreu logo depois de ter nascido, e o casamento durou pouco. Em
setembro de 1921, oito anos depois da sua chegada aos Estados Unidos e
quando ainda não tinha concluído o seu contrato com a First National,
Chaplin decidiu viajar à Europa. A sua passagem por Paris e Londres foi
memorável. Durante essa viagem, conheceu várias personalidades do mundo
da cultura e escreveu um livro, My Trip Abroad, baseado nessa
experiência.
As Mulheres e o Cinema
Edna Purviance deveria ter interpretado o papel de Josefina no filme
sobre o imperador francês, mas, nesse momento, outras mulheres surgiram
na vida de Chaplin. A primeira foi a sua própria mãe, que se mudou de
Londres para uma casa na costa da Califórnia, onde o seu filho a
instalou sob os cuidados de uma enfermeira. Nessa casa, a velha atriz
assistiu com grande orgulho todos os filmes de Chaplin, até morrer, em
1928, durante a filmagem de O Circo, filme com que Chaplin ganhou o seu
primeiro Oscar. A segunda destas mulheres, com a qual Chaplin teve uma
relação muito agitada foi Peggy Hopkins Joyce, dona de uma conta
bancária de três milhões de dólares. Ela contava histórias sobre as suas
relações sentimentais, como a de um jovem que se suicidou por sua causa
em Paris. Chaplin não deixou nenhuma dessas histórias escapara e
inspirou-se nelas para o filme A Opinião Pública (1923), sua estréia
definitiva na United Artists, que curiosamente não contou com a presença
do "Tramp".
Chaplin também tinha conhecido Pola Negri, quando a atriz alemã estreou
em Hollywood. A relação de Pola Negri com Chaplin foi um escândalo
alimentado pela imprensa sensacionalista, com manchetes que anunciavam
um casamento que nunca chegou a ocorrer. A aventura foi rapidamente
superada pela chegada de uma jovem admiradora mexicana, que vestiu o
pijama de Chaplin, meteu-se na sua cama e depois tentou envenenar-se
diante da porta da sua casa.
Porém Chaplin acabou sucumbindo aos encantos de Lita Grey. Lita, ainda
adolescente, conseguiu ser escolhida para protagonizar a primeira
comédia de Chaplin para a United Artists, o longa-metragem Em Busca do
Ouro (1925). Durante as filmagens, Lita demonstrou sintomas de gravidez,
e o cineasta, que sabia que manter relações sexuais com uma menor era
um delito, resolveu casar-se rapidamente com ela. Em junho de 1925,
nasceu Charles Chaplin Jr. e, nove meses mais tarde, o segundo filho,
Sidney Earle. Mas a relação entre o casal deteriorou-se e o divórcio foi
anunciado em agosto de 1927. Nas suas memórias, Chaplin guarda um
prudente silêncio sobre esse casamento, alegando que "como temos dois
filhos que amo muito, não entrarei em detalhes".
A única satisfação desse casamento infeliz foi a substituição da sua
esposa por Geórgia Hale como protagonista de Em Busca do Ouro. Durante
as filmagens, Chaplin conheceu a atriz Marion Davies, amante do magnata
William Randolph Hearst e anfitriã de festas memoráveis na sua mansão de
San Simeón. Um outro importante produtor que esteve em contato com
Chaplin foi Josef Von Sernberg. Ele produziu um filme intitulado The
Seagull, baseado em um relato do próprio Chaplin sobre os pescadores da
costa californiana. Edna Purviance e Eve Sothern eram as protagonistas,
mas o produtor ficou insatisfeito com o resultado, retirando o filme de
circulação e destruindo-o antes de ter estreado.
Chaplin dirigia, depois, O Circo, mas a liberdade de que tinha gozo até
então parecia estar com os dias contados. Em 1927, enquanto Chaplin
recebia o cientista Albert Einstein na sua mansão e emprestava a sua
quadra de tênis para o produtor soviético Serguei Eisenstein relaxar, o
produtor Joseph M. Schenk assumiu a presidência da United Artists. O
maior problema foi a aparição do cinema sonoro. A partir da estréia do
filme O cantor de Jazz, em outubro de 1927, o cinema começou a
incorporar o som. Chaplin começou as filmagens de Luzes da Cidade (1928)
e percebeu que o cinema mudo tinha seus dias contados. Apesar disso,
não admitia que o "Tramp" falasse e, depois de interromper as filmagens
por algumas semanas, decidiu tomar partido por seu personagem e opor-se
totalmente ao cinema sonoro. Em uma entrevista para a revista Motion
Pictures Herald, declarou: "Detesto os talkies. Eles chegaram para
destruir a arte mais antiga do mundo, a arte da mímica. Derrubam o
edifício atual do cinema. A beleza plástica continua sendo a coisa mais
importante do cinema. O cinema é uma arte pictórica". Ao contrário de
Eisenstein, que conseguiu adaptar o som à sua revolucionária concepção
de montagem, a partir do Manifesto do Contraponto Orquestral, de 1930,
Chaplin foi ainda mais reacionário. Ao retomar as filmagens de As Luzes
da Cidade, decidiu que o seu filme incorporaria uma partitura sonora que
ele mesmo compôs, baseada na popular La violetera, mas vetou o uso da
palavra. Só uma pessoa com tanto poder em Hollywood, como ele, poderia
ter tomado uma decisão tão radical; alugou uma sala de exibição em Nova
Iorque, com mais de mil lugares, onde exibiu o filme durante doze
semanas.
Anos Turbulentos
A estréia de Luzes da Cidade em Londres foi o pretexto para uma outra
viagem à Europa. Dentre as personalidades públicas, políticas e
culturais com as quais entrou em contato, estavam Winston Churchill,
Mahatma Gandhi, John Maynard Keynes, George Bernard Shaw, H. G. Wells,
Aristide Briand, a condessa de Noailles, além de alguns membros da
realeza. Chaplin era uma celebridade mundial e era também uma
personalidade pública que nunca escondeu sua simpatia pelo socialismo e
pela defesa das classes oprimidas. Somerset Maugham escreveu: "Tenho a
impressão de que sente saudade dos subúrbios. (...) Acho que se lembra,
com nostalgia, da liberdade da sua juventude difícil, com a pobreza e as
amargas privações, e sabe que nunca estará satisfeito". O cineasta
escreve na sua biografia: "Esta maneira de querer fazer com que a
pobreza do próximo seja atraente é péssima. Eu ainda não conheci um
pobre que sinta falta da pobreza ou que se sinta livre sendo pobre".
Depois da crise de Wall Street, com o New Deal e com a efervescência dos
movimentos fascistas europeus, a consciência de Chaplin
intensificou-se: "Eu não sou patriota. Como se pode tolerar o
patriotismo, quando seis milhões de judeus foram assassinados em seu
nome?". O cineasta transferiu essas inquietações para os seus dois
únicos longas-metragens feitos durante os anos trinta.
O primeiro filme, Tempos Modernos (1936), é uma sátira sobre a alienação
dos operários no processo de produção em série. O protagonista continua
sendo o "Tramp", que não diz nenhuma palavra durante todo o filme. O
segundo filme é ainda mais radical: apesar de toda a prudência que
Hollywood manteve com relação ao nazismo até 1938, Chaplin não duvidou
em caricaturar Adolf Hitler. O Grande Ditador (1940), de Chaplin, e
Confessions of a Nazi Spy (1939), de anatole Litvak, foram os dois
primeiros filmes americanos a declararem guerra ao nazismo. Na Alemanha,
nos países ocupados ou aliados o filme foi proibido, os países neutros
tiveram que esperar um outro momento político para exibirem o filme. Nem
todos os americanos se identificaram com o discurso pacifista que o
protagonista divulga no final. Franklin D. Roosevelt recebeu Chaplin,
pessoalmente, na Casa Branca, depois de ter solicitado uma projeção
privada de O Grande Ditador, sendo seu único comentário bastante
lacônico: "Sente-se, Charlie, o seu filme nos está dando muitas dores de
cabeça".
Pelo simples fato de ter sido o diretor e intérprete do filme, Chaplin
foi rotulado pelos movimentos anticomunistas que surgiram depois da
Segunda Guerra Mundial. Rodar um filme anti-nazista e expressar
argumentos humanitários em favor de uma nação aliada eram motivos
suficientes para ser mal visto nos Estados Unidos, que, paradoxalmente,
estavam em guerra com a Alemanha e ao lado da União Soviética.
Nessa época, Chaplin já tinha conhecido a sua quarta esposa. Era Oona
O'Neil, filha do famoso dramaturgo Eugene O'Neil. Os dois se casaram em
1943, em uma pequena cidade da costa da Califórnia. Uma curiosa
coincidência fez com que, nessa mesma época, Chaplin decidisse filmar
Monsieur Verdoux (1947), baseado em um biografia de Landru, um sádico
assassino que matava mulheres depois de seduzi-las. Apesar da idéia de
rodar esse filme ter sido de Orson Welles, o cineasta inglês decidiu
realizar o projeto e fazer o primeiro filme em que o "Tramp" estaria
excluído definitivamente. Monsieur Verdoux não apenas foi censurado pela
Motion Picture Association, mas também por um amplo setor da imprensa e
por algumas organizações de direita. O filme acabou sendo um verdadeiro
fracasso. O círculo de intelectuais formado por Salka Viertel, Clifford
Odets, Aldous Huxley, Hanns Eisler, Theodor Dreiser e Bertold Brecht
fortaleceu a sua imagem anti-amenricana. Nessas circunstâncias, o Comitê
de Atividades Anti-americanas incluiu Chaplin numa primeira lista de
"testemunhas hostis", tornando-se conhecidos como "os dez de Hollywood".
Como Chaplin demorou a ser citado, decidiu antecipar-se e declarar por
escrito: "Para a sua conveniência, direi o que eu acho que desejam
saber. Não sou comunista e nunca fiz parte de nenhum partido ou
organização política na minha vida. Sou o que vocês chamam de traficante
da paz. Espero que não se sintam ofendidos por isso".
Um rei no exílio
Apesar desse ambiente totalmente hostil, Chaplin ainda rodou outro filme
nos Estados Unidos, Luzes da Ribalta (1952), um melodrama sobre um
artista do music-hall que dedica seus últimos anos de vida a incentivar a
carreira de uma jovem bailarina. Nesse filme, Chaplin trabalhou com
Buster Keton, outro grande ator cômico da época.
Em setembro de 1952, Chaplin recebeu a visita de funcionários do
Departamento de Imigração por causa da suspeita sobre a sua militância
comunista, a falta de patriotismo que tinha impedido a sua
nacionalização e a suspeita de adultério. Eram os últimos dias de
Chaplin nos Estados Unidos. Com a desculpa de tirar umas férias, foi
para Nova Iorque apresentar Luzes da Ribalta à imprensa e, junto com sua
mulher e os quatro filhos do casal, embarcou para Londres, no Queen
Elizabeth. Depois de dois dias de viagem, Chaplin recebeu um telegrama
comunicando a abertura de uma nova investigação, solicitada pelo Fiscal
Geral do Estado, na qual voltavam a aparecer as antigas acusações sobre
suas atividades políticas e sua vida particular, o que significou a
ruptura definitiva com o país onde tinha vivido durante quarenta anos. A
estréia de Luzes da Ribalta (1952) em Londres, Paris e Roma fez com que
Chaplin viajasse bastante pela Europa, instalando-se em uma mansão
perto da cidade suíça de Vevey. Oona voltou aos Estados Unidos para
resolver questões bancárias, pegar os negativos dos filmes de Chaplin e,
de volta à Europa, no consulado americano de Lausanne, renunciou à sua
cidadania. Chaplin também devolveu seu visto de regresso, alegando que
"já estava velho demais para agüentar tantas bobagens". Mesmo assim
continuou a encontrar-se com importantes políticos como Winston
Churchill - que o censurou por não ter respondido à sua felicitação pela
estréia de Luzes da Ribalta -, Kruschov, Nehru e Chu En-Lai, sem
abandonar completamente a possibilidade de continuar trabalhando para o
cinema.
Apesar de Chaplin ter escrito a sua autobiografia entre 1958 e 1964, não
mencionou em nenhum momento o filme Um rei em Nova Iorque (1956). O
filme, rodado em Londres, foi sua vingança definitiva por todas as
humilhações passadas nos Estados Unidos.
Nove anos mais tarde, em 1965, Chaplin retomou um antigo roteiro que
havia escrito para Paulette. A Condessa de Hong Kong foi protagonizado
por Sofia Loren e Marlon Brando. Chaplin interpretou um pequeno papel de
garçom e o filme teve uma péssima crítica na Europa.
Apesar disso, o cineasta ainda viveu o suficiente para receber vários
prêmios. Em 1971, a Academia de Hollywood quis restaurar a sua reputação
nos Estados Unidos com um Oscar especial "pela incalculável
contribuição à arte do século: o cinema". Um ano mais tarde recebeu
outro Oscar com um sabor especial, o de melhor trilha sonora pelo filme
Luzes da Ribalta, que por não ter estreado em Los Angeles pôde ser
candidato ao Oscar vinte anos depois. Nessa ocasião Chaplin decidiu
voltar aos Estados Unidos e pisou um palco pela última vez, sendo
aplaudido durante muitos minutos. Três anos mais tarde, a rainha da
Inglaterra o nomeou cavaleiro do Império Britânico. Em 1977, na fria
madrugada de 25 de dezembro, o cineasta deu seu último suspiro, aos
oitenta e oito anos de idade. Morria o gênio de infância triste que, com
os seus filmes, fez com que milhares de espectadores do mundo inteiro
rissem e chorassem...
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